quarta-feira, 19 de junho de 2013

Situação de aprendizagem



PAUSA
MOACYR SCLIAR
Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para o banheiro. Fez a barba e lavou-se. Vestiu-se rapidamente e sem ruído. Estava na cozinha, preparando sanduíches, quando a mulher apareceu, bocejando:
            —Vais sair de novo, Samuel?
Fez que sim com a cabeça. Embora jovem, tinha a fronte calva; mas as sobrancelhas eram espessas, a barba, embora recém-feita, deixava ainda no rosto uma sombra azulada. O conjunto era uma máscara escura.
            —Todos os domingos tu sais cedo – observou a mulher com azedume na voz.
            —Temos muito trabalho no escritório – disse o marido, secamente.
Ela olhou os sanduíches:
            —Por que não vens almoçar?
            —Já te disse: muito trabalho. Não há tempo. Levo um lanche.
A mulher coçava a axila esquerda. Antes que voltasse a carga, Samuel pegou o chapéu:
            —Volto de noite.
As ruas ainda estavam úmidas de cerração. Samuel tirou o carro da garagem. Guiava vagarosamente, ao longo do cais, olhando os guindastes, as barcaças atracadas.
Estacionou o carro numa travessa quieta. Com o pacote de sanduíches debaixo do braço, caminhou apressadamente duas quadras. Deteve-se ao chegar a um hotel pequeno e sujo. Olhou para os lados e entrou furtivamente. Bateu com as chaves do carro no balcão, acordando um homenzinho que dormia sentado numa poltrona rasgada. Era o gerente. Esfregando os olhos, pôs-se de pé:
            —Ah! Seu Isidoro! Chegou mais cedo hoje. Friozinho bom este, não é? A gente...
            —Estou com pressa, seu Raul – atalhou Samuel.
            — Está bem, não vou atrapalhar. O de sempre - Estendeu a chave.
Samuel subiu quatro lanços de uma escada vacilante. Ao chegar ao último andar, duas mulheres gordas, de chambre floreado, olharam-no com curiosidade:
            —Aqui, meu bem! – uma gritou, e riu: um cacarejo curto.
Ofegante, Samuel entrou no quarto e fechou a porta a chave. Era um aposento pequeno: uma cama de casal, um guarda-roupa de pinho: a um canto, uma bacia cheia d’água, sobre um tripé. Samuel correu as cortinas esfarrapadas, tirou do bolso um despertador de viagem, deu corda e colocou-o na mesinha de cabeceira.
Puxou a colcha e examinou os lençóis com o cenho franzido; com um suspiro, tirou o casaco e os sapatos, afrouxou a gravata. Sentado na cama, comeu vorazmente quatro sanduíches. Limpou os dedos no papel de embrulho, deitou-se fechou os olhos.
Dormir.
Em pouco, dormia. Lá embaixo, a cidade começava a move-se: os automóveis buzinando, os jornaleiros gritando, os sons longínquos.
Um raio de sol filtrou-se pela cortina, estampou um círculo luminoso no chão carcomido. 
Samuel dormia; sonhava. Nu, corria por uma planície imensa, perseguido por um índio montado o cavalo. No quarto abafado ressoava o galope. No planalto da testa, nas colinas do ventre, no vale entre as pernas, corriam. Samuel mexia-se e resmungava. Às duas e meia da tarde sentiu uma dor lancinante nas costas. Sentou-se na cama, os olhos esbugalhados: o índio acabava de trespassá-lo com a lança. Esvaindo-se em sangue, molhando de suor, Samuel tombou lentamente; ouviu o apito soturno de um vapor. Depois, silêncio.

Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para a bacia, lavou-se. Vestiu-se rapidamente e saiu.
Sentado numa poltrona, o gerente lia uma revista.
            — Já vai, seu Isidoro?
            —Já – disse Samuel, entregando a chave. Pagou, conferiu o troco em silêncio.
            —Até domingo que vem, seu Isidoro – disse o gerente.
            —Não sei se virei – respondeu Samuel, olhando pela porta; a noite caia.
            —O senhor diz isto, mas volta sempre – observou o homem, rindo.
Samuel saiu.
Ao longo dos cais, guiava lentamente. Parou um instante, ficou olhando os guindastes recortados contra o céu avermelhado. Depois, seguiu. Para casa.

(in: Alfredo Bosi, org. O conto brasileiro contemporâneo. São Paulo: Cultrix, 1977. p. 275)

Situação de Aprendizagem
Público alvo: 8ª série/9º ano
Tempo previsto: 6 aulas
Objetivos:
·        Estimular o gosto pela leitura.
·        Reconhecer as características do gênero conto;
·        Identificar os elementos da narrativa presentes no texto;
·        Trabalhar as capacidades de leitura.
Conteúdos: Gênero conto, os elementos da narrativa e a intertextualidade.
Competências e habilidades:
·        Identificar os elementos da narrativa;
·        Levantar hipótese sobre o texto;
·        Localizar e comparar informações presentes no texto;
·        Perceber as relações de intertextualidade;
·        Recuperar o contexto de produção do texto;
·        Analisar características do conto e desenvolver competência leitora.
Estratégias: leitura e análise do conto, fazendo intervenções por meio de estratégias de leitura.
Recursos: texto, imagens, música e vídeo.
Avaliação: discussão dirigida; análise e comparação de informações; produção e reescrita do texto.
Capacidades de leitura
Nessa situação de aprendizagem serão trabalhadas as seguintes capacidades de leitura:
·        Ativação do conhecimento prévio, Antecipação e Checagem de hipóteses;
·        Localização e Comparação de informações e Generalizações;
·        Produção de inferências locais e globais;
·        Recuperação do contexto de produção;
·        Definição de finalidades da atividade de leitura;
·        Percepção das relações de intertextualidade;
·        Percepção de outras linguagens.

Leitura do conto PAUSA de MOACYR SCLIAR

Antes da leitura
Ativação do conhecimento prévio
            O professor antes da leitura poderá fazer uma sensibilização com algumas imagens que sugerem uma pausa em diferentes contextos. Durante a discussão sobre as imagens o professor poderá ir anotando as principais ideias na lousa.
           


Antecipação e Checagem de hipóteses

Após a sensibilização, o professor poderá apresentar o título do conto (Pausa) para ativar os conhecimentos prévios dos alunos sobre o assunto, para que eles possam ir construindo hipóteses. Pode-se iniciar com perguntas como:
1. Quando vocês querem dar uma pausa? Onde geralmente vocês preferem ficar?
2. Em que situações as pessoas precisam de uma pausa? Por quê?
3. O que sugere o título Pausa?
4. O que você espera que aconteça para que alguém possa pedir uma pausa?
4. O que vocês pesam quando fazem uma pausa? Vocês recordam de fatos ou criam situações imaginárias?

Durante a leitura

            O professor pode iniciar a leitura e parar em alguns trechos, pedindo para que os alunos possam antecipar o que poderá acontecer. Por que ele mente para a esposa? O que ele poderia fazer naquele hotel pequeno e sujo? O que levou Samuel a sair todo domingo de sua casa? O professor poderá anotar as principais informações levantadas pelos alunos durante a leitura, para depois compará-las com as reais informações do texto. 

Após a leitura

Localização de informações, Comparação de informações e Generalizações.

Os alunos deverão localizar algumas informações importantes do texto, como:

  1.  Quem narra a história? O narrador é observador ou onisciente? Justifique sua resposta com trechos do texto.
  2. Quem são as personagens envolvidas?
  3. Onde se passam os acontecimentos narrados?
  4. O enredo pode ser dividido em realidade e imaginação. Quais são os acontecimentos reais? O que Samuel imagina?
  5. Por que o protagonista inventa um pseudônimo? Qual era ele?
  6. No final do conto Samuel se despede do gerente, mas afirma que não sabe se volta domingo que vem. Por que o gerente desmente a personagem?
  7. O que o hotel simboliza para Samuel?
  8. O que os fatos narrados revelam sobre a personalidade das personagens narradas? Descreva-as com base nessas informações.
  9. Descreva a rotina do protagonista.


Produção de inferências locais e globais


1.    Alguns elementos do texto nos permitem dizer que as personagens são casadas, mas o relacionamento não está bem. Que elementos são estes?
2.    Alguns elementos da rotina de Samuel nos ajudam a entender o motivo dele ir ao hotel todos os domingos. Cite esses motivos.
3.     Apesar do relacionamento distante do casal, o protagonista se preocupa em voltar para casa. Por que será que isso acontece?

Recuperação do contexto de produção


O professor, nesse momento, poderá apresentar o livro em que o texto lido foi publicado e explicar que é um capítulo do mesmo, destacando que na referência bibliográfica, ao final do texto, há informações importantes. Por meio delas, os alunos poderão indicar:

a.                Quem é o autor do texto? Você já leu outro texto dele?
b.                Em que gênero podemos enquadrar o texto “Pausa”? Justifique a sua resposta.
c.     Considere o título do livro em que o texto foi publicado,  O conto brasileiro contemporâneo, e relate que textos podemos encontrar nos outros capítulos?
d.                Quem será o leitor desse livro?
e.                Qual a intenção do autor?

Percepção das relações de intertextualidade

O professor poderá apresentar a letra da música “Rotina” (Titãs) Depois, pedir para que os alunos respondam:

Rotina
Compositor: Clemente / Marcelino
Acorda cedo para ir trabalhar
E o relógio de ponto a lhe observar
No lar esposa e filhos a lhe esperar
Sua cabeça dói, um dia vai estourar
Com essa rotina, rotina
Rotina, rotina
Sua cabeça dói, não consegue pensar
E as quatro paredes a lhe massacrar
Daria tudo pra ver o que acontece lá fora
Mesmo sabendo que não iria suportar
Essa rotina, rotina
Até quando ele vai aguentar?
Até quando ele vai aguentar?
No lar a sua esposa lhe serve o jantar
E os filhos brincam na sala de estar
Levanta da poltrona e liga a TV
Chegou a hora do programa começar
Rotina, rotina
O homem da TV lhe diz o que fazer
Lhe diz do que gostar, lhe diz como viver
Está chegando a hora de se desligar
A sua esposa lhe convida para o prazer
Rotina, rotina

a)      A letra da música retrata uma rotina. Como é ela? Descreva-a.
b)     O que se assemelha o tema da música e o do conto?
c)    Quais são as principais diferenças em relação ao tema abordado na música e no conto?

Percepção de outras linguagens

O professor poderá sugerir assistir ao filme “Click “ para comparar o texto ao filme. Também, poderá pedir sugestões para os alunos de outros filmes com a mesma temática.
Depois de assistir ao filme, o professor pode sugerir que os alunos comparem as personagens e suas rotinas, analisando as semelhanças e diferenças.

Produção de texto 

Após o trabalho com a leitura, os alunos poderão escrever sobre sua experiência pessoal em relação ao tema do texto lido ou criar uma personagem que vivencie tal experiência. Depois da produção textual, os alunos poderão trocar seus textos com outros alunos, para enriquecê-los.
O professor após ler os textos poderá sugerir a reescrita, para melhorar ainda mais o texto produzido pelo aluno.


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